– Como proceder na tradução –
Ao longo dos anos, temos vindo a tratar, neste espaço, vários temas relativos à tradução jurídica. Hoje, chegou a vez da organização do texto jurídico e, mais concretamente, a organização textual do contrato.
Já aqui afloramos a importância da clareza e da precisão dos textos jurídicos. Sobretudo em contratos, deve evitar-se os jargões ou uma linguagem excessivamente técnica. Para evitar possíveis ambiguidades, há quem inclua uma pequena lista de terminologia (no início ou no fim do contrato) com os termos e conceitos mais importantes.
Generalidades
De um modo genérico, é bem conhecida a estrutura-padrão de um contrato (título, identificação das partes, preâmbulo ou considerandos e cláusulas). Mas, e em termos de organização textual?
Em nome da já referida clareza (a que acrescento a coerência), sugere-se com frequência que a cada parágrafo corresponda apenas uma ideia, e que os mesmos sejam relativamente curtos.
O uso do negrito e do itálico não está proscrito e deverá servir para realçar um nome ou conceito.
A ordem de explanação deve repousar sobre a cronologia ou a sequência lógica de eventos.
Enumerações e/ou subdivisões
As dúvidas maiores começam a surgir aquando de enumerações e/ou da subdivisão de uma secção.
Independentemente da técnica utilizada para enumerar, é importante usar de consistência, isto é, se começar uma lista com números, letras ou marcadores, mantenha a mesma estrutura ao longo de todo o documento. É também importante usar uma pontuação apropriada, como vírgulas (,) ou ponto e vírgulas (;), para separar os diversos elementos de uma enumeração.
A indentação é uma ferramenta útil para indicar subitens ou os diferentes níveis hierárquicos de uma lista. Itens relacionados devem estar corretamente alinhados para indicar a sua relação.
Obviamente, a formatação e a organização de um texto jurídico devem ser adaptadas às diretrizes específicas do local onde o contrato será usado (pois as práticas podem variar em diferentes jurisdições).
Para obter informações específicas sobre essas diretrizes de formatação e organização do texto no sistema jurídico português, podem ser consultadas fontes oficiais como manuais de redação jurídica (algumas sociedades de advogados têm os seus próprios manuais) e/ou guias ou minutas que possam ser fornecidos pela Ordem dos Advogados ou por instituições académicas (faculdades de direito).
Na tradução
No contexto da tradução de um texto jurídico, é importante manter a estrutura geral (do contrato, por exemplo), incluindo a sequência das cláusulas para preservar a lógica e a coesão do documento
Alguns países podem ter preferências específicas quanto à forma como os documentos são estruturados. Nesses casos, a formatação (nomeadamente, a organização de parágrafos e a numeração das cláusulas) pode ser adaptada ao estilo padrão documentos jurídicos do país de destino.
No caso português, sugerimos que se sigam as normas preconizadas no Manual Comum de Apresentação e Redação elaborado conjuntamente pelo Parlamento Europeu, o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia, e do qual extraímos a tabela abaixo sobre subdivisões orgânicas:
No caso dos contratos, cabe ao redator fazer as devidas adaptações e ao tradutor respeitá-las e, quando necessário, adaptá-las.
E por falar em contratos, devemos usar o termo “cláusula” ou “artigo”?
De acordo com o advogado Rui Pinto Duarte, será mais correto usar o termo “cláusula”: em Portugal, o mais vulgar, entre os juristas, é chamar “cláusula” a cada unidade em que se divide um contrato e “artigo” a cada unidade em que se divide uma lei ou um regulamento. No entanto, por vezes, também se usa “artigos” para designar as unidades em que se divide um contrato. O contrário, porém, não se verifica: os juristas nunca usam cláusulas para designar as unidades em que se dividem as leis e regulamentos.
Não deixa de ser interessante constatar que quanto mais trabalhamos em tradução jurídica, mais questões vêm a lume. Esta é deveras uma área da tradução estimulante!